O projeto Cinema Falado, que traz mensalmente filmes brasileiros para serem exibidos e comentados por especialistas em cinema no MIS Cine Santa Tereza terá sua primeira edição do ano com o longa “A Marvada Carne”, no dia 21 de janeiro, próxima terça-feira, às 19 horas, na sala Geraldo Veloso e o cineasta Paulo Augusto Gomes comentará o filme. Imperdível!

A promoção é do Centro de Estudos Cinematográficos e do Instituto Humberto Mauro. O projeto conta a partir de 2020 com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura. A entrada é gratuita. O endereço é Praça Duque de Caxias, bairro Santa Tereza, Belo Horizonte.

Cinema Falado

Cinema Falado é um projeto do Centro de Estudos Cinematográficos de Minas Gerais (CEC-MG) e do Instituto Humberto Mauro, em memória do crítico e cineasta Geraldo Veloso.

A Marvada Carne

Nho Quim vagueia com o seu cachorro pelo interior na esperança de conseguir realizar seus dois sonhos: encontrar uma noiva e comer carne de vaca. No lugar onde ele vai acabar parando, onde há uns três ou quatro casebres, um deles de uma conhecida de Quim, Nhá Tomasa (Lucélia Maquiavelli), vive uma garotinha de uns 17 anos que tudo que quer na vida é encontrar um marido. A garotinha, Carula (Fernanda Torres) trava longos diálogos – bem, monólogos, vai – com uma estatuinha de Santo Antônio, o santo casamenteiro. Ela reza, pede a ajuda do santo – mas, como o marido está demorando a chegar, discute com a estatuinha, briga com ela, quase a afoga no riacho em que lava roupa. Mais tarde, num acesso de fúria, joga o santo pela janela – e o santo, é claro, cai bem na cabeça de Quim.

Ficha técnica:

A Marvada Carne
Data de lançamento: 1985 (Brasil)
Direção: André Klotzel
Autor: Cornélio Pires
Roteiro: André Klotzel, Carlos Alberto Soffredini
Elenco: Fernanda Torres, Adilson Barros e Regina Casé, Dionísio Azevedo e Geny Prado
Música composta por: Rogério Duprat, Passoca, Hélio Ziskind

 

“A Marvada Carne”, filme de André Klotzel, arrebatou 11 prêmios no 13º Festival de Gramado, participou da Semana da Crítica no Festival de Cannes e levou mais de 800 mil pessoas aos cinemas. Foi a produção que se tornou o traço mais forte da obra de André Klotzel, um diretor de poucos mas marcantes filmes. Traz ironia no texto e na construção dramática, aliada a uma composição visual verista – direção de arte, fotografia e som próximos da realidade – e a uma encenação dos atores que se esmera na naturalidade. Segundo o crítico Jean-Claude Bernardet, um falso naturalismo permeia a obra de Klotzel. Para ele, a chave da ironia baseia-se na máxima de que, “apesar de toda a verossimilhança, uma fábula está sendo contada”.

O roteiro é baseado na peça “Na Carreira do Divino” (1979), do dramaturgo e corroteirista Carlos Alberto Soffredini: um caipira deseja comer carne de boi e uma moça da roça quer casar.

Dentro da cultura caipira, o diretor se inspirou no escritor Cornélio Pires e no ator Genésio Arruda, mas o que mais transparece em “A Marvada Carne” é a influência de Mazzaropi. Adilson Barros se parece com o Jeca e Geny Prado e Dionísio Azevedo foram atores frequentes de filmes de Mazzaropi.

Comentários de Paulo Augusto Gomes

Paulo Augusto Gomes é cineasta, diretor dos filmes de curta-metragem “Graças a Deus” (1978), “Os Verdes Anos” (1979), “Sinais da Pedra” (1980), “Minas Portuguesa” (2003) e “O Horizonte de JK” (1998), entre outros. Dirigiu também os longas “Idolatrada” (1983) e “O Circo das Qualidades Humanas” (2000), este último em parceria com Jorge Moreno, Geraldo Veloso e Milton Alencar Jr. É também autor do livro “Pioneiros do Cinema em Minas Gerais” (2006). Foi crítico de cinema do jornal “Estado de Minas” e ensaísta no “Suplemento Literário do Minas Gerais”. Publicou também textos na revistas “Filme Cultura” e “Guia de Filmes” e nos livros “Godard e a Educação”, “Howard Hawks – Integral”, “Cinema em Palavras” e “Os Filmes que Sonhamos”. Foi ainda co-editor do livro “Presença do CEC – 50 Anos de Cinema em Minas”.

Sobre André Klotzel

Nos anos 80, em São Paulo, um grupo de cineastas, muitos deles formados na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), fez sua estreia em filmes de longa-metragem de um modo diverso ao da produção da Boca do Lixo, polo industrial que se notabilizara pelas pornochanchadas e que começava a sofrer a pressão dos exibidores para realizar filmes de sexo explícito. Esses realizadores propuseram uma nova via para o cinema popular e se organizaram em várias produtoras, sediadas no mesmo bairro, o que acabou identificando essa fase como “o cinema da Vila Madalena”.

André Klotzel é um dos nomes desse cinema por causa da estreia bem-sucedida de “A Marvada Carne” (1985), que recebe críticas positivas na imprensa e grande apoio do público. Nascido em São Paulo capital em 1954, Klotzel estudou cinema na ECA/USP, entre 1973 e 1978, realizando, durante a faculdade, os curtas-metragens “Eva” (1975) e “Os Deuses da Era Moderna” (1977). Foi aluno do crítico Paulo Emílio Salles Gomes, que o influenciou, especialmente ao tratar do conceito de cinema popular. Em 1974, estagiou em produtoras da Boca do Lixo. Trabalhou como assistente de produção em “Exorcismo Negro” (1974), de José Mojica Marins, e nos episódios de Adriano Stuart em “Cada um Dá o que Tem” (1975) e “Sabendo Usar Não Vai Faltar” (1975); foi assistente de direção em “Kung Fu Contra as Bonecas” (1976), também de Stuart; e novamente assistente de produção em “Curumin” (1978), de Plácido Campos. Em 1980, foi assistente de direção de Nelson Pereira dos Santos em “Na Estrada da Vida”. Em “Janete” (1982), de Chico Botelho, foi assistente de direção e corroteirista. Ainda em 1982, dirigiu o curta-metragem “Gaviões”, documentário sobre a torcida corinthiana.

Em 1983, com os fotógrafos Pedro Farkas e José Roberto Eliezer, o diretor Ricardo Dias e a produtora Zita Carvalhosa, fundou a Superfilmes, que se associou à Tatu Filmes para produzir seu primeiro longa-metragem, “A Marvada Carne”. O filme arrebatou 11 prêmios no 13º Festival de Gramado, participou da Semana da Crítica no Festival de Cannes e levou mais de 800 mil pessoas aos cinemas.

Era a consagração de um tipo de cinema de que o cinema brasileiro estava carecendo: autoral e que se comunicava com o grande público. Em 1987, Klotzel produziu o longa-metragem “Anjos da Noite”, de Wilson Barros. Em 1989, dirigiu o curta “No Tempo da Segunda Guerra”, começando a trabalhar na elaboração de seu segundo longa, “Capitalismo Selvagem”, que seria concluído em 1993. Em 1996, Klotzel dirigiu seu curta-metragem mais notável, “Brevíssima História das Gentes de Santos”, documentário realizado para a prefeitura da cidade. Do final dos anos 90 é a sua adaptação do romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis, lançado em 2001 com o título “Memórias Póstumas”.

Deixando a Superfilmes, Klotzel fundou, em 2006, a Brás Filmes, onde dirigiu “Reflexões de um Liquidificador”. Desse ano é também o curta “O Bom Retiro é o Mundo”, realizado para o projeto História dos Bairros de São Paulo.